Em entrevista ao Correio Braziliense, professor da Universidade de Brasília (UnB) fala sobre nova variante descoberta na África.
Qual a diferença da nova variante em relação às outras?
Essa variante tem mais modificações (mutações) no gene da proteína spike do que as outras “variantes de preocupação”. Essas mutações (mais de 30) incluem algumas presentes nas outras variantes de preocupação, que estão envolvidas na maior transmissibilidade e no menor reconhecimento dos anticorpos produzidos por infecções anteriores e gerados pelas vacinas baseadas na proteína spike.
Qual a diferença entre a ômicron e a delta?nullPUBLICIDADEnull
A principal diferença é o número de mutações na proteína spike. Além disso, como ela está dominando uma região em que a variante delta estava circulando, significa que tem um potencial de transmissão maior, que já é acima das outras variantes.
Quais os principais perigos que a ômicron traz?
Como essa proteína spike é a base para a produção das principais vacinas disponíveis no mundo, as mutações acarretam uma mudança na estrutura do vírus. Com isso, os anticorpos produzidos pela vacinação e por infecções anteriores por outros vírus podem não neutralizar essa variante nova, resultando em um aumento de reinfecções.
Neste contexto de pandemia, o que a ômicron tem de diferente? Ela é mais perigosa?
Como essa variante foi descoberta muito recentemente, ainda não sabemos se causa uma doença mais severa.
O que já se sabe desta variante ômicron?
Até o momento, sabe-se que a variante aparenta ser mais contagiosa do que a delta e que foi detectada principalmente no sul do continente africano. Entretanto, novos relatos estão sendo feitos em diferentes países, inclusive da Europa.
Neste contexto de pandemia, é normal surgir novas variantes?
É uma questão de tempo, pois os vírus produzem variantes a todo momento. Quando um vírus infecta um hospedeiro (animal, por exemplo), ele vai se reproduzir nas células, gerando cópias com pequenas modificações (mutações). Essas mutações podem ajudar ou prejudicar o vírus. As mutações que ajudam o vírus a produzir mais vírus são fixadas no genoma e as modificações que prejudicam o vírus são eliminadas. Logo, os vírus estão em contínua produção de variantes se adaptando ao hospedeiro. Um exemplo disso são os vírus da gripe, que precisam ser monitorados constantemente para o surgimento de novas variantes. Outro exemplo é o vírus HIV, que também produz variantes e vem se adaptando aos pacientes que tomam medicamentos para combatê-los. Várias drogas que antes eram usadas para tratamento do HIV não funcionam mais porque o vírus sofreu mutações e a droga não consegue mais se ligar ao vírus e ter seu efeito.
Com essa nova variante, é possível que, chegando ao Brasil, o número de casos e de mortes aumente?
Como essa nova variante parece ser mais transmissível, um aumento de casos é esperado. Entretanto, o Brasil tem uma cobertura vacinal maior do que muitos países. Acredito que a probabilidade de aumento de mortes e casos graves não se concretize. Existem relatos iniciais de que essa variante não induz sintomas graves. Nós ainda não conhecemos a fundo a capacidade de infecção dessa nova variante.
Como o senhor vê a chegada dessa nova variante, diante da flexibilização que o Brasil tem feito para as medidas restritivas? Não seria um momento de dar uma “freada”?
Não podemos achar que a pandemia acabou, pois o surgimento dessa nova variante e o aumento dos casos nos países da Europa estão aí para provar o contrário. Logo, é muito importante termos ciência de que não podemos nos comportar da mesma forma que estávamos acostumados antes da pandemia. Alguns comportamentos, como lavar as mãos constantemente, uso de máscaras e distanciamento social, mostraram-se efetivos para diminuição da transmissão de diversas doenças. O distanciamento social deve ainda fazer parte da nossa rotina por algum tempo. Nossos gestores precisam avaliar a situação com cautela, ouvindo diferentes especialistas antes de aumentar a flexibilização. Esse vírus veio para ficar na população humana. Ele se tornará endêmico e precisamos aprender a conviver com ele. Não podemos deixar de investir em educação, saúde e ciência. Só com um povo instruído poderemos combater a desinformação e enfrentar os desafios de se viver em um mundo muito desigual.
Correio Braziliense.