Da FolhaPE
O presidente eleito dos Estados Unidos, Joe Biden, disse, na noite deste sábado (7), que os eleitores lhe deram uma vitória “convincente” após a projeção de que ele teria derrotado Donald Trump.
“Esta é a hora de cicatrizar na América”, disse um entusiasmado Biden a apoiadores em um comício ao ar livre em sua cidade natal, Wilmington, Delaware.
“Prometo ser um presidente que não busca dividir, mas unificar”, disse Biden, traçando um forte contraste com os quase quatro anos polarizadores de Trump.
Reconhecendo a decepção dos apoiadores de Trump, Biden disse deles: “Eles não são nossos inimigos. Eles são americanos”.
“Deixem essa era de demonização na América começar a terminar aqui”, convocou.
Ao abrir o discuro do presidente eleito, a vice-presidente eleita Kamala Harris disse que os eleitores trouxeram um “novo dia para a América”.
“Quando nossa própria democracia estava nas urnas nesta eleição, com a própria alma da América em jogo e o mundo assistindo, vocês deram início a um novo dia para a América”, disse Harris, a primeira mulher eleita para a vice-presidência. “Fui a primeira, mas não serei a última”, afirmou sob aplausos.
Trump, o primeiro presidente americano a perder a reeleição desde George H. W. Bush no início da década de 1990, recusou-se a conceder a vitória.
“Esta eleição está longe de terminar”, acrescentou ao chegar a um campo de golfe que possui na Virgínia, em sua primeira saída da Casa Branca desde o dia das eleições, em 3 de novembro.
“Eu ganhei as eleições (…) coisas ruins aconteceram”, disse o presidente de 74 anos, em um longo tuíte em letras maiúsculas no qual repetiu acusações sem provas de fraudes maciças.
Trump já havia se declarado vencedor na noite da eleição. Diante da vantagem crescente de Biden na apuração, ele insistiu em suas alegações de fraude, ameaçando ir à Suprema Corte.
Apesar de terem ocorrido em meio à pandemia de covid-19 e em um clima político tenso, as eleições decorreram sem incidentes graves ou falhas técnicas sendo relatados.
A campanha Trump ameaçou ação legal em vários estados. Mas os especialistas afirmam que Trump tem poucas chances de reverter os resultados, ao deixar de apresentar evidências de fraude.
“A estratégia de litígio de Trump não vai a lugar nenhum. Não fará diferença no resultado da eleição”, disse Richard Hasen, especialista em direito eleitoral na Universidade da Califórnia, Irvine.
Festas e confiança
Em Washington, milhares de pessoas se aglomeraram na Casa Branca e na “Black Lives Matter Plaza”, um trecho de rua que leva à residência presidencial chamada meses atrás para denunciar a violência policial contra afro-americanos.
“Todos estão felizes”, disse Yannh Djedjro, um cientista da computação de 32 anos, junto com sua noiva e filha.
“Finalmente sabemos que não teremos mais quatro anos de Donald Trump!”, exclamou Alex Norton com seu bebê nos braços sob um sol forte.
Em Nova York, local de nascimento de Trump e reduto democrata, houve lágrimas de alegria e buzinas.
“Trump é um fascista, um racista, um homófobo, um islamófobo. Tudo o que ele representa vai contra meus valores e como fui criado”, disse Hiram González, filho de imigrantes mexicanos.
Mas no Arizona, que ainda não declarou vencedor e a vantagem de Biden sobre Trump é pequena, ou na Flórida, onde Trump já venceu, muitos dos apoiadores do presidente repetiram suas denúncias.
“A Suprema Corte é quem deve decidir”, disse Maria Teresa Chao, uma cubano-americana de 86 anos do bairro de Little Havana, em Miami.
CNN, NBC News e CBS News anunciaram a vitória de Biden pouco antes das 11h30 (horário local, 12h30 de Brasília), após declará-lo o vencedor na Pensilvânia, seu estado natal.
“Parabéns aos meus amigos”, tuitou Barack Obama, saudando uma vitória “histórica e decisiva”.
O ex-candidato à presidência dos Estados Unidos, Mitt Romney, foi o primeiro peso-pesado republicano a parabenizar Biden e Harris, pessoas de “boa vontade e caráter admirável”.
Os governantes de Reino Unido, Canadá, Alemanha e Irlanda foram rápidos em enviar seus bons presságios.
Meio século de carreira política
Joseph Robinette Biden Jr. se tornará o 46º presidente dos Estados Unidos em 20 de janeiro ao meio-dia, conforme prevê a Constituição.
Até lá, os estados certificarão seus resultados e os 538 eleitores do colégio eleitoral se reunirão em dezembro para nomear formalmente o presidente.
Aos 78 anos, que completará 20 de novembro, será o mais velho a assumir o cargo.
Esse centrista que já enfrentou a ala mais esquerdista do Partido Democrata, chega à Casa Branca em sua terceira indicação, depois de tentar em 1988 e 2008.
Para Biden, trata-se de uma coroação após meio século de carreira política, incluindo oito anos como braço direito do primeiro presidente negro da América.
Ridicularizado por Trump, que o apelidou de “Joe, o dorminhoco”, acusando-o de diminuição das habilidades mentais, Biden é conhecido por sua empatia após várias tragédias pessoais: ele perdeu sua primeira esposa e filha em um acidente de carro em 1972, e quatro décadas depois, outro de seus filhos, Beau, por câncer no cérebro.
Agora, Biden prometeu restaurar a “alma” dos Estados Unidos, atingido por uma pandemia que mata mais de 236.000 e desencadeou a pior crise econômica em um século e massivos protestos sociais.
O país está profundamente dividido em questões como raça, imigração, porte de armas e vínculo com o resto do mundo após o governo Trump, sob o lema “América primeiro”.
E embora Biden tenha vencido, metade do eleitorado apoiou Trump, que acumulou um fluxo impressionante de mais de 70 milhões de votos.
Essa divisão certamente continuará a impactar o Congresso, onde os republicanos devem manter sua maioria no Senado e os democratas, embora ainda controlem a Câmara, perderam cadeiras.
O custo da pandemia
Biden venceu ao reconquistar Pensilvânia, Michigan e Wisconsin, estados democratas tradicionais que Trump conquistou em 2016 com o apoio dos eleitores brancos da classe trabalhadora.
Quando a votação terminou, Biden conquistava pequenas maiorias no Arizona e na Geórgia, dois baluartes republicanos.
Em campanha respeitosa às restrições da covid-19, Biden se apresentou como o líder responsável e apegado à ciência de que o país precisa para enfrentar a emergência sanitária e suas consequências.
Trump, por outro lado, fez eventos em massa em um ritmo frenético após ser hospitalizado por causa do vírus, e minimizou o covid-19.
Mas a pandemia ofuscou as conquistas econômicas de seu governo, seu principal ativo. E longe do discurso conciliatório de Biden, Trump destinou à sua base afirmações infundadas, como retratar os imigrantes sem documentos como assassinos e estupradores, dizendo que os democratas iriam banir as armas e desconsiderar a “lei e a ordem”.
Trump, que chegou ao Salão Oval em 2016 como um ‘outsider’ político após chocante vitória sobre Hillary Clinton, emergirá após sobreviver ao impeachment, quebrando as normas diplomáticas internacionais e acostumando os americanos a escândalos sem fim.
Alvo de duas investigações que podem levar a julgamentos por suposta evasão fiscal, fraude e declarações falsas, seu horizonte pode ser sombrio.
O carismático apresentador do reality show “O Aprendiz” pode se gabar de que seu movimento impulsionou o Partido Republicano, e até sonha em concorrer novamente em 2024. Mas, como reconheceu no dia da eleição, para ele “perder nunca é fácil”.